Desde a primeira assinante premium (oi, Mitie!) penso no que poderia oferecer para quem apoia financeiramente o leitor comum. Ser lido e receber curtidas já é um baita incentivo para continuar escrevendo, mas o apoio de vocês conta demais para que eu seja mais ambicioso nas coisas que publico online.
Quando comecei a citar os discos que escuto enquanto escrevo as cartas, pensei em falar um pouco mais sobre “o primeiro na vitrola”, aquele que estampa cada edição da newsletter. Não o fiz antes porque logo vi que seria mais uma desculpa para adiar o envio das cartas. Deixei para pensar um pouco melhor e escrever com calma o que deu para fazer em matéria de ensaio musical.
Como nossa coleção já passou dos 90 discos, já tasquei dois zeros na numeração. E agora vou descobrir junto com vocês como se desdobrará essa série de textos. Boa leitura!
Update 16/09/2024: atualizei os registros visuais, agora com fotos produzidas por AlexXx, também conhecido como mozão.
SOUR, de Olivia Rodrigo
Como a conheci: Lembro que a capa virou meme na época do lançamento (várias pessoas encheram a cara de adesivos e rolou até filtro do Instagram) e da polêmica que fez a artista creditar Hayley Williams em “good 4 u”, mas nada disso me despertou interesse em ouvi-la. Só parei para escutar SOUR num dia em que Alex pediu pra Alexa tocar e reconheci alguns trechos onipresentes no TikTok (“deja vu” em especial).
Características físicas: A capa é estilo gatefold (ou seja, daquelas que abrem como revista) e a cor do disco é bem bonita: fruit punch — basicamente vinho. O disco é bem pesadinho, deve ter 180g.
O que gosto no álbum: Eu acho bonita a capa e gosto muito da cor do disco. Além disso, ter aberto meu coração para conhecer a cantora me fez dar uma chance a seu álbum seguinte, GUTS, que adorei — eu mesmo peço pra Alexa tocar quando vou lavar uma louça.
Onde adquirimos: Na loja da Universal, numa promoção.
Favoritas: “brutal”, “traitor”, “good 4 u” e “jealousy, jealousy” (são as favoritas de Alex, mas concordo plenamente; só acrescentaria “hope ur ok”).
Fun fact: nessa casa chamamos ela carinhosamente de Olivia Rogéria. Achamos engraçado quem fala Rodriga Rodrigo, mas aqui em casa esse apelido não pegou.
Um passeio pelo disco
Você chegou em minha famosa casa rosa e o drink que recebeu de mim foi um Shirley Temple. “Que delicinha, nem parece que tem álcool!”, você me diz e eu respondo: “É porque não tem!” e te mando o link com a receita. Alex já ajeitou a vitrola e pôs a agulha no disco: violinos suaves começam a tocar, logo interrompidos agressivamente por guitarras.
01_brutal: O comecinho soa engraçado para o ouvinte adulto — especialmente alguém com um mocktail na mão —, mas é quase uma distração para quem só espera angústia adolescente no álbum. A canção é sobre dar a cara a tapa, abandonar redomas e correr riscos, manter-se fiel a si mesmo no processo. Fazer o próprio caminho mesmo sem saber por onde começar. Gostei.
I'm so insecure I think
That I'll die before I drink
02_traitor: Essa é para quem tem lua em câncer e gosta de drama, mas tem o sol em capricórnio e guarda todos os recibos, liga os pontos e até ganharia o amor de volta perante um júri, caso o coração se submetesse ao devido processo legal. Lembrei-me de situações parecidas na minha vida.
Guess you didn't cheat, but you're still a traitor
03_drivers license: Coisa ruim de término é o mapa compartilhado da cidade, agora contaminado pela ausência. Algo na atmosfera da música me lembrou a do álbum Blue Neighbourhood, de Troye Sivan.
Yeah, you said forever
Now I drive alone past your street
04_1 step forward, 3 steps back: Realmente lembra as lentinhas da Taylor, para as quais nunca tive muita paciência. Mas quem nunca se apaixonou por alguém e não quis largar o osso, mesmo notando os abusos? Não quer largar o osso do amor porque ama o amor, pois quem poderia se conter tendo um coração que ama e, neste, coragem de tornar esse amor conhecido?
And maybe in some masochistic way
I kinda find it all exciting
Like, which lover will I get today?
05_deja vu:
Viajei um pouco nos comentários da música anterior, citando Shakespeare e fugindo de pensar num cidadão que merecia ser pisoteado numa performance alegre de sapateado. Pois bem, voltei a pensar nele. É uma canção sobre reaproveitar coisas (lugares, situações, comidas, piadas e sons) especiais do casal com o/a novo/a amado/a. E ainda detesto pensar em palavras minhas sendo subvertidas em prol da escrita desse pulha.Essa é a do Tiktok!
(Yeah, everything is all reused)
06_good 4 u: Finalmente uma divertida como a primeira! Uma boa forma de terminar o Lado A do disco. Essa foi uma das primeiras que me pegou e me fez pensar: até que não foi uma aquisição ruim. Gosto especialmente quando ela troca “God, I wish that I could do that” por “like a damn sociopath” no finzinho.
Good for you, you're doin' great out there without me
Baby, like a damn sociopath
07_enough for you: Não sei se foi por ter visto há tão pouco tempo o novo show de Clarice Falcão (amo!), mas a letra dessa combina com o apagamento de si mesmo (em “benefício” do ser amado) que se vê em quase todas as canções de Monomania — estou pensando principalmente em “Qualquer negócio”. Lembrou-me também de “Your Type”, de Carly Rae Jepsen, e empalideceu ainda mais nessa nova comparação.
Stupid, emotional, obsessive little me
08_happier: Outra lentinha que cheira a Clarice Falcão — o que só conspira para a teoria de que “bad idea right?”, de GUTS, foi inspirada em “Ideia merda”, de Truque. Essa “happier” é o “Eu esqueci você” dela.
I hope you're happy, but don't be happier
09_jealousy, jealousy: Já deu pra notar que gosto mais das agitadinhas, como esta. Para além dela retomar a vibe roqueirinha que tanto me apraz — já fui de ouvir Avril Lavigne em loop —, gosto que essa canção não é mais sobre um amante perdido/inalcançável, mas sobre um sentimento corriqueiro a quem produz arte: inveja. Fiquei com vontade de recomendar a ela o ensaio da Contrapoints sobre o assunto.
Com-comparison is killin' me slowly
10_favorite crime: Maaaaais uma lentinha e eu começo a me perguntar se queria prestar tanta atenção em cada faixa desse álbum. Para quê? Não bastava falar das favoritas e que o álbum era coeso ao ponto de não precisar pular nenhuma canção, algo muito mais difícil de fazer num vinil? Mas agora já estou quase no fim e vejo que gosto de pelo menos um verso dessa música.
One heart broke, four hands bloody
11_hope ur ok: A última faixa de SOUR também é lenta, mas dessa eu gostei. Fecha bem o projeto do álbum: se começa admitindo a brutalidade do dar a cara a tapa, ela termina mais segura de si e disposta a olhar para outros sobreviventes da adolescência, fase em que tudo é tão intenso. Aqui o desejo de que a pessoa esteja mais feliz — happier — soa sincero.
Estaria Olivia amadurecendo? Isso só GUTS dirá.
His parents cared more about the Bible
Than being good to their own child
A essa altura o seu drink é só gelo derretido e caroço de cereja e eu te pergunto: o que quer ouvir agora?
Espero que tenham gostado! Abraço e até a próxima edição!
Adorei o experimento e os comentários da vez! Aguardo o próximo disco!